A problemática da génese do Estado-nação põe-se, com maior clareza, na Europa, fruto dos mais diversos processos históricos, sociais e económicos que levaram à sua constituição. A ideia de Estado-nação nasceu na Europa em finais do século XVIII e inícios do século XIX. Provém do conceito de "Estado da Razão" do Iluminismo. Hastings, fala-nos de factores como uma obra escrita em língua vernácula de uma ou mais etnias, como o foi o caso da Bíblia, da guerra contra uma ameaça externa e da religião como factores que contribuíram para o aparecimento dos Estados-nação. Contudo, algo que mais sobressai na abordagem de Hastings é, precisamente, o facto de um Estado-nação pressupor, necessariamente, a presença de etnias (grupo de pessoas com identidade cultural e língua comum). Note-se que a etnia não se identifica com a nação, uma vez que esta é formada pela comunidade de duas ou mais etnias, e é algo mais conscientes do que a etnia. De modo que, a nação exige, pela sua natureza, o direito à identidade, à autonomia política como povo e, sobretudo, o controlo de um determinado território. Por outras palavras, a Nação - Estado não pode ser vista fora de três eixos fundamentais: o território, a nação e a soberania. E, na verdade, o Estado-nação foi mais bem sucedido em função da coesão étnica e cultural, ou seja, da presença de uma maior homogeneidade na população. Não é por caso que se aponta Portugal, a Islândia e o Japão, como os Estados-nação mais conseguidos.
Nos dias que correm, o Estado-nação, encontra-se ameaçado pela nova ordem mundial. Neste sentido, não há dúvida de que a globalização foi o factor que o abanou, quer sob o ponto de vista teórico, quer prático. É, que, se por um lado, a globalização está a originar a criação de vários tipos de união, como é, por exemplo, a União Europeia, por outro, devido sobretudo à globalização económica, a noção de Estado deixou de estar, exclusivamente, associada à soberania total ou à territorialidade, por as fronteiras se tornarem mais permeáveis económica e culturalmente, formando-se, assim, uma espécie de estados transnacionais. Mas também é verdade que a globalização trouxe consigo vários fenómenos colaterais. O primeiro, é a afirmação dos movimentos de identificação cultural sub-estatais, seguido do abalo do conceito de nacionalismo, uma vez que se o nacionalismo defende a ideia de que a nação deve dispor do seu próprio estado e que a tradição nacional deve ser defendida, a todo o custo, pelo Estado, o estado transnacional, conforme foi definido por Guiddens, colide com tal ideia.
Este processo, pese embora os reveses que lhe são inerentes, está em curso, sobretudo na Europa, com a União Europeia, mas a verdade é que, o seu impacto nos países africanos tem sido, de um lado, devastador e, do outro, pouco compreendido. É que, a África, cujos Estado foram retalhados milimetricamente na célebre Conferência de Berlim, logo após a independência, passou (e ainda continua) por várias guerras, motivadas externamente ou não, durante o penoso processo de formação das suas nações. A África encontra-se, assim, praticamente de mãos atadas, sem vislumbrar as formas para sair de tão intricado labirinto.
Uma das possíveis saídas é, sem dúvida, a reafirmação dos movimentos de identificação cultural, como uma forma de se fazer frente ao “estigma” da periferia. Quanto mais os países africanos, com a intervenção do Estado, as forças políticas e a sociedade civil, estiveram empenhados na promoção dos valores culturais locais, com o concurso da revolução tecnológica, maiores probabilidades terão para contornarem a situação. E, neste caso, o exemplo dos países asiáticos é o mais esclarecedor.
No caso de Angola, a nova ordem mundial foi de igual modo devastadora e não podia chegar no pior momento. A classe dirigente angolana e as suas elites, esforçam-se para seguir, à letra, os ditames do Ocidente. Em cada dia que passa é corrente vermos, no país, a tentativa de adoptar os modos de falar da antiga potência colonial e os modos de pensar, vestir, costumes de consumo, habitação, e a linguagem política do Ocidente. O significado, os valores autóctones, as estruturas familiares, as solidariedades clânicas, as cosmogonias comunitárias e as condutas que este geram foram simplesmente mutiladas, pervertidas e desacreditas. A cultura tradicional foi negada e asfixiada por uma cultura de imitação, porque institucionalmente se organizou o processo para o seu esquecimento, o que nos põe, cada vez mais, no abismo da periferia.
Trata-se de uma tragédia, para um país como Angola que sustenta e alimenta, em grande medida, os ditos governos transnacionais que nos depilam a cada dia que passa.
Bibliografia:
Hastings, Adrian (1997). The Construction of Nationhood: Ethinicity, Religion and
Nationalism. Cambridge: Cambridge University Press.
Giddens, Anthony (1993). Consecuencias de la modernidad. Madrid: Alianza.
Giddens, Anthony (2000). Un mundo desbocado. Los efectos de la globalización en
nuestras vidas. Madrid: Taurus.
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