Nesta reflexão iremos analisar de que forma a construção e manutenção dos partidos políticos, bem como as suas ideologias, políticas e formas de actuação, dependem do grupo étnico a que pertencem os seus fundadores e dirigentes.
Começaremos por dar uma pequena definição de Etnia. Esta consiste numa unidade tradicional de consciência de grupo, que se distingue dos demais devido a partilha dos mesmos valores, cultura, raça, proveniência tribal ou tradição histórica. Todavia, actualmente, este conceito tem - se alterado e é comummente utilizado para designar os grupos minoritários e os grupos alvos de descriminação. No entanto, tem-se de ter em atenção que o conceito de etnia acarreta forte implicações a nível do racismo.
Angola é um país multi - étnico, existindo cerca de cem etnias e sub etnias, cada uma delas com a sua própria língua, constituídas, na sua maioria, por indivíduos de origem Bantu. Os principais grupos étnicos são: Ovimbundu, grupo étnico mais populoso, constituído por várias sub etnias (bailundos, huambos, bies, etc.). Este situa-se a sul do rio Kwanza, no vasto Planalto Central, e fazem a transição entre os povos do litoral e os do interior. Os M`bundu (kimbundu) fixaram-se principalmente na região costeira (Luanda, Muxima) e nas regiões do Bengo, Matamba. Os Bankongo (kikongo) pertenciam ao reino do Congo (abrangia o antigo Congo belga, o francês e o norte de Angola), situam-se no norte de Angola, a sua área de influência vai até ao rio Dande. Estes três grupos representam 75% da população angolana e têm o maior poder político e económico.
Angola esteve sobre domínio português desde o século XVI até ao século XX (1975). O clima de tensão entre as duas maiores potências no pós Segunda Guerra Mundial, que dividiu o mundo em dois blocos antagónicos - por um lado os chamados socialistas dominados pela URSS e, por outro lado, as democracias ocidentais orientadas pelos Estados Unidos da América - influenciou o desenvolvimento de revoltas no seio das colónias, e isto foi acentuado pela participação das colónias (Índia, Senegal, Marrocos, Egipto, etc.) na guerra, a apoiarem as potências.
Outra forte influência foi a determinação dos EUA e da URSS, durante as conferências de Yalta e de Postdam, "a favor dos direitos dos povos à "autodeterminação[1]. A partir daí, e com apoios internacionais, inicia-se o processo de descolonização.
Focando-nos em Angola, denota-se que actualmente existem cerca de 180 partidos políticos. Porém iremos debruçar-nos somente nos mais importantes e influentes, uma vez que estes são os que têm um maior número de assentos no parlamento e são os mais reconhecidos pela sociedade civil. Ora, dos 220 assentos existentes no Parlamento MPLA tem 191 (81,64% dos votos), a UNITA tem 16 (10,39% dos votos) e a FNLA tem 3 (1,11%, tendo se retirado do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional, em 1998).
Comparativamente aos outros países, em Angola os movimentos de descolonização começaram mais tarde, mas foram de igual forma intensos. Foi nesse período que começaram a surgir os partidos políticos, que inicialmente estavam unidos pela mesma causa - autonomia nacional, a independência de Portugal. Os partidos políticos que surgiram foram o MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola, criado em Dezembro de 1956; a FNLA - Frente Nacional de Libertação de Angola criada em 1962 (foi a junção de outros dois partidos - a UPA e a PDA)[2] e por último a UNITA - União Nacional de Independência Total de Angola, criada por Jonas Savimbi em Março de 1966 depois de ter saído da FNLA.
A origem de cada um desses partidos é marcada por uma forte influência étnica, isto é, cada partido tem origem numa determinada região e é constituído por um grupo especifico de pessoas, por exemplo, o MPLA é constituído (ou pelo menos foi inicialmente) por comunidades brancas, mestiças e kimbumdu (M`bundu), sendo actualmente constituído, na sua totalidade por indivíduos oriundos das zonas costeiras (Luanda e arredores). A FNLA surgiu no seio dos povos Bakongos do norte de Angola (a sua a origem resulta da fundação da União dos Povos do Norte de Angola). Por fim, a UNITA, que tem como base de apoio o povo Ovimbundu do Planalto Central. A divisão dos movimentos nacionalistas angolanos é sui generis nas colónias portuguesas.
No entanto, só nos pós 1975, é que estas rivalidades étnicas entre os partidos políticos sobressaíram, ou seja, só depois da Independência de Portugal, e quando se esperava uma unidade entre o povo angolano, é que começaram as disputas entre os movimentos nacionalistas (os partidos políticos). A proclamação da Independência foi feita num só momento mas em três lugares diferentes (Luanda, Huambo e Ambriz, capital de Bengo) [3] , com ideais políticos e propósitos completamente antagónicos o que enviesou por completo o fim da luta pela libertação.
Um factor que intensificou o conflito entre os partidos políticos angolanos foi a Guerra - fria. Uma vez que esses partidos passaram a ser apoiados pelas grandes potências que se encontravam em conflito (EUA e URSS). Em Angola, passou-se a dar uma maior importância à defesa do partido político per si do que ao bem-estar da Nação, o que por sua vez levou a mudanças no quadro conceptual da história angolana.
As contradições étnicas provocadas pela luta de libertação foram levadas ao extremo pela guerra civil que detinha profundas conotações tribais. Desta forma, os princípios de cidadãos comuns foram abandonados e passaram a ser exaltados os valores tribais, regionais e raciais, que se mantiveram até 2002. [4] Desde então tentou-se afirmar a identidade angolana, mas, para isso será preciso rever-se o passado histórico, resolver a questão dos antagonismos étnicos herdados do passado, porque só desta forma é que se conseguirá uma unidade do povo angolano, "um só povo uma só Nação".
Para concluir, devemos salientar que é, de facto, importante rever-se o sistema político angolano. É fulcral separar a vida social e cultural da política para que se possa ter um país mais unido e equilibrado em todos os níveis. Pois, numa sociedade onde em primeiro lugar estão os valores regionais e tribais nunca poderá haver entendimento entre os cidadãos, e consequentemente, estes permanecerão em constante conflito dificultando o desenvolvimento político, económico e social do país.
Referências Bibliográficas:
Comerford, G,( 2005), O Rosto Pacifica de Angola. Biografia de um processo de paz (1991-2002). John Meinert Prnting, Windhoek.
Guardiola, N, Guerras e Intrigas, http://www.angonoticias.com/ (acesso em 1 de Junho de 2007).
Hidimbwa, A. Depois do` 75. Conotações étnicas, dimensão da identidade e o futuro de Angola como Nação, http://www.caaei.org/anexos/76.doc. (acesso em 29 de Maio de 2007).
Rocha, E, (2003), Angola, Contribuições ao estudo da Génese do Nacionalismo Moderno Angolano (período 1950-1964) Testemunho e Estudo Documental. Lisboa.
[1] Edmundo Rocha, Angola (período de 1950-1964);
[2] UPA - União dos Povos de Angola; PDA - Partido Democrático de Angola.
[3] Leonidio Altino Hidimbwa , Depois de 75.
[4] Morte do líder da UNITA Jonas Savimbi, o maior opositor do governo de Eduardo dos Santos.
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